segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Às vezes...

Ás vezes é bom somente ficar ali em seu canto, ouvindo as músicas que se gosta, curtindo um momento seu sem se importar com mais nada. Estou ouvindo Amy Winehouse agora, pensando que as possibilidades da vida estão aí, e nós muitas vezes temos que fazer escolhas, decidir por qual caminho seguir, e isso significa não seguir por outra estrada.
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Ainda está chovendo, aliás choveu tanto essa semana que estou me sentindo meio embolorado. Daqui a pouco preciso organizar minha agenda de trabalho, e o lado bom disso é ocupar a mente. Acho que a grande vantagem de se trabalhar não são as conquistas, mas o fato de nos empenharmos em algo, e fazer desse algo nossa jornada.
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Será que vale a pena ir registrando tudo num diário de bordo? Pode ser que daqui alguns anos eu não queira me deparar com os dias que se passaram. Ou quem sabe eu nem me lembre deles. Melhor seria se eles rissem pra mim ao longo do tempo, nos fios de cabelo branco que começarem a aparecer.
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Andança, vida, é tudo isso aí mesmo. Fico aqui agora, curtindo meu som, meu silêncio, o frio e a chuva que me confortam.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Assuma o controle daquilo que você quer ler, ouvir e assistir!!

Vírus H1N1. (Foto retirada da internet)

Aproveitando mais um momento de insônia, um pouco de gripe e cansaço, estou pensando em escolhas possíveis. Se você precisa ficar um pouco em casa e repousar, não será na TV que será possível encontrar consolo. A TV aberta de hoje tem se mostrado sem nenhum conteúdo. Seja informativo, seja diversão. Nada se aproveita, tamanha superficialidade da sua programação. Aliás, uma programação arcaica, voltada para o passado, repetindo as mesmas piadas e formatos de programa de trinta anos atrás.
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Por outro lado, a TV a Cabo dá um pouco mais de possibilidades ao telespectador, seja por oferecer mais canais com programações específicas, seja porque o conteúdo é um pouco mais selecionado, um pouco melhor elaborado. Mesmo assim, existe uma escassez. Tanto, que é possível você assistir a um programa dezenas de vezes. Você encontra um documentário e, se ficar conectado àquele canal por muito tempo irá decorar as falas dos narradores, de tanto que assistirá ao mesmo conteúdo.
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Já a internet é mais democratica, diversificada, pois permite que você administre aquilo que interessa. Claro que tem muito conteúdo descartável, desprezível, mas por ter uma maior variedade, tem mais possibilidades. Mas se você não encontrar um único veículo de comunicação ou site que lhe interesse, crie um blog, coloque gadgets interessantes pertinentes aos seus interesses particulares, assuma o controle do que quer ler, do que quer ouvir, de quais vídeos quer assistir. Faça de seu blog seu espelho, seja egoísta dentro dele, e coloque somente aquilo que lhe convém.
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Contudo, este momento transitório das mídias e internet, em geral, é muito promissor. Nos faz imaginar que em pouco tempo teremos uma programação totalmente integrada, seja via computador ou smarthphone, ambos fazendo funções múltiplas.
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Pelo fato de integram TV, escola e cursos variados, bancos, compras em geral, rádios, vídeos, fotos, jornais, vídeo-conferências, uma verdadeira viagem que permite te transportar para qualquer lugar, em qualquer idioma, sob qualquer paisagem ou trânsito caótico, sou um otimista e entusiasta das novas tecnologias disponíveis. Se imaginarmos as transformações sofridas nos últimos dez anos, podemos sim imaginar que os próximos dez anos serão ainda mais ricos em questão de conteúdo, de praticidade, de segurança.
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Fazendo uma breve regressão, quando se iniciaram as vendas pela internet, as pessoas olharam com muita desconfiança, tanto pelo medo de não receber as mercadorias compradas, quanto pelo fato de pagar suas compras com cartão de crédito, expondo todos os seus dados e documentos pessoais numa rede em que tudo parecia incerteza.
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Não demorou muito para que a grande maioria percebesse que se tratava de um sistema seguro, prático, e que em muitos dos casos permitia aos compradores fazerem escolhas e pagar menos por um produto, identificando lojas e marcas com preços menores e de boa qualidade. Ao mesmo tempo, em caso de dúvida sobre o produto, o serviço prestado ou a respeito da empresa, basta acessar alguns sites e se inteirar do assunto.
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Num outro panorama, empresas que haviam inventado seu negócio de acordo com as regras do século XX, estudando formas de contato direto, face to face, junto aos clientes tiveram que desmanchar todos os seus conceitos e formas de produção, para se adequar a velocidade e exigências do século XXI. Os clientes passaram a exigir mais, a escolher mais, e a se antecipar às novas tendências e lançamentos do mercado, e cobrar isso dos fornecedores, das lojas. Afinal, alguém tem que oferecer aquilo que você deseja. Isto sem falar que as novas gerações estão cada vez mais ansiosas por novidades, produtos interativos, que não tenham apenas uma única função em específico.
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Como disse, sou um entusiasta das novas tecnologias. E em tempos de gripe suína, fazer minhas compras e pagar minhas contas pela internet é muito mais seguro do que pegar uma fila ao lado de pessoas que eu não sei se lavaram as mãos de forma adequada, ou se carregam algum virus que, de fato, possa me contaminar.

domingo, 2 de agosto de 2009

Um Momento

Neste domingo, dia 02 de agosto, estou revendo o baú das memórias literárias. E decidi colocar outro conto, "Luzes da Ribalta", aqui em meu blog. Assim como "A Crônica que nunca Escrevi", este também faz parte do livro "Janelas para Babilônia".
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Estou re-organizando os contos, e até mesmo arriscando algumas novas linhas de outras narrativas que pretendo acrescentar. É meu laboratório para escrever num espaço menor, e num tempo simultâneo entre as histórias. Você dimensiona uma situação, e foca sua atenção nela, sem estender demais para outros assuntos. Pelo menos, é assim que gosto de escrever os contos. Concentrado no momento, em uma situação mais singular.
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Sempre gostei da idéia do conto. Dos primeiros em que li, Machado de Assis foi leitura obrigatória. Depois, Guimarães Rosa, Júlio Cortazar e Anton Tchecov. São referências que recordo, no sentido de leitura; boas referências, por sinal, não pelo fato de serem escritores de renome internacional, mas por terem estilos particulares, diferentes, e acho que esse pequeno grupo se completa quanto ao assunto conto literário.
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Voltando ao meu texto, trata-se de um momento. Um pequeno e particular momento em que uma prostituta tem antes de iniciar seu "serviço". O que se passa em sua cabeça? Recordações, reflexões do que está fazendo ali, saudades. Espero que apreciem a leitura abaixo.

Luzes da Ribalta

Um risco de lágrima na pouca maquiagem sobre o rosto impossibilitava concluir o trabalho daquele momento; apoiou contra a face o dedo indicador na altura da boca, e foi subindo sutilmente até os olhos, fechou-os. Faltava pouco para o que ela chamava de “batente”. Balançou a cabeça, não resistia àquele disco do Roberto Carlos, eu choro mesmo, quando eu ouço essa música, dizia ela, engolindo alguns soluços. Todo início de noite era a mesma coisa.
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Única recordação de casa, lembrou do filho, dos pais, das irmãs. “Hora do batente, hora do batente!” Seu ponto era o mesmo, a esquina da banca de jornal com a padaria, quase cem metros da portaria do prédio.
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Já vestira o vestido curto de couro sintético, vermelho com alças, acima dos joelhos. Longo demais, em comparação ao das outras meninas. Não gostava muito das pernas, tentava escondê-las, pois acreditava já ter passado da idade. A meia era quase branca, sobre a mesa os brincos de argola, se olhou no espelho, lugar à sala que considerava o camarim. Havia duas lâmpadas acima, refletiam direto ao rosto, sentia-se uma atriz. Iniciou outra do Roberto, soluçava. Recordava o rapaz de sua cidade; “por que não me casei com aquele desgraçado, meu Deus? Por quê?”
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Percebeu o rosto um pouco inchado, olhos quase vermelhos e embaçados, colocou os brincos e esboçou um sorriso tímido, disfarçando-se para si mesma. Mais outra lágrima escorreu-lhe os olhos. E com a voz em soluços abafados, tentava acompanhar, “do tipo que ainda manda flores, apesar do velho tênis...e da calça desbotada, ainda chamo de querida namorada!”.
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Veio-lhe a imagem de Atílio, era dele que gostava; ele, o mesmo que foi ao portão de sua casa, o mesmo que a levou para passear na boléia do caminhão, o mesmo que ela desprezara.
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Na estante marrom, desbotada, envelhecida e coberta de poeira, o relógio acusava mais uma hora. Gostava do relógio, comprado no camelô, rosa. Também havia foto do filho, num porta-retratos de plástico preto com detalhes em flores contorcidas e prateadas.
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Sentiu um aperto com o peso da solidão, a hora do trabalho aproximava, talvez para distraí-la; na realidade já deveria estar lá; “as meninas já devem estar sentindo minha falta”!
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Tirou os brincos, veio a imagem da companheira que a abandonara; nem tanto pelo aluguel, com quem dividia, mais pelas conversas que iniciavam lá pelas cinco da manhã, quando terminavam com o último cliente e subiam o prédio pela escadaria, em geral levemente alcoolizadas. A colega fora para o Rio de Janeiro, dançar em boate de Copacabana, estava melhor lá, dizia; “os gringos todos vão para lá, meu bem, fuck me dóllars”. Ela, nem pensar. Ficaria ainda mais longe do filho e dos pais.
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Sequer os visitava, mas acreditava estar perto o suficiente para se tranqüilizar. Se ao menos encontrasse uma boate, dançarina virava mais dinheiro. Mas as coisas estavam em crise, assistia ao fim da tarde ao jornal televisivo; adorava a voz do presidente, achava-o sensual. Felizmente (ou não) aquele dinheiro suado que ganhava pagava o aluguel, a comida, as bijuterias e perfumes que comprava a duras prestações com a moça de nariz fino e voz engraçada. Sobrava algum para mandar ao filho, era pouco.
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A pizza esfriava sobre o fogão, não tinha tanta fome, mas era preciso, alguns clientes a exigiam demais, às vezes reclamava às companheiras. Sabia também que na sua idade estava ficando galinha velha. Seios caídos, rugas nas pálpebras, o antigo problema com as pernas, “finas demais, até a bunda fica estranha. Sem grana pra plástica, realmente a coisa tá ficando difícil”.
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Teria que comer sozinha, estava atrasada e se observava no espelho; usava cílios e unhas postiças. Adorava os programas de final de ano, tudo para ouvir Roberto Carlos, “ele também é lindo”. Parecido com o seu Atílio, ou com o pai, ou com a fantasia que fazia para o filho; era o símbolo do círculo que a cercava. “Ainda falta tanto”.
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“Calabresa?!” Não queria comer; por ela, ficava ouvindo aquelas músicas até o amanhecer. Não as ouvia em tom alto, havia criança nova no apartamento ao lado, de olhos brilhantes, iguais aos do seu quando nascera.
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A música a impedia continuar, terminou de comer uma fatia. Não era o suficiente, forçosamente deu mais mordidas noutro pedaço. Voltou ao “camarim”. Tinha que terminar a maquiagem, algumas das meninas com certeza já tinham embarcado nos primeiros afetados, como elas costumavam dizer.
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Foi obrigada a reforçar o pó-de-arroz, sempre precisava esconder aquela “cara feia de chorona”. Era sentimental, pesou novamente a solidão. Talvez convidasse alguma para dormir com ela; tinha cama vazia, alguma comida na geladeira, também cerveja gelada, meia garrafa de conhaque e outra de rum, acaso fizesse frio. E o principal, sua vitrola com o disco que trouxera como recordação.
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Correu para a janela, tentando identificar quais ainda estavam lá. Era primeiro andar. Viu Aninha Buracão; chamou-a, esta não ouvia. “A Geni também, e a Pérola Negra, metida”! Gritou, ficou ruborizada pela atitude, Buracão percebeu. “Você não vai descer, não? Já perguntaram por você. Desce logo, menina!” Acenou com a mão, correu para o espelho.
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Da gaveta tirou a pequena bolsa; levava batom, lápis, preservativos, pois era instruída pela assistência social de uma comunidade filantrópica; também carregava um punhal, que nunca usara. Papel, caneta de brinde, uma pequena agenda, moedas, cartão telefônico, outra caneta, uma toalha de rosto, um lenço, cartão de advogado, às vezes precisava de doutor pra se safar de carrerão de polícia, uma pequena foto do filho e uma medalha de Nossa Senhora, “pra me proteger”.
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Antes de levantar, quis permanecer mais. Ficou a olhar a foto do filho, com certeza estava maior que ali. Fixa, sequer importou com clientes que a esperavam, se é que a esperavam. “Que esperem, maldição!” Não tinha notícias de casa, devia descer e ligar pra eles, saber das coisas. Esperou que terminasse a música. Não havia tempo para virar o disco. A janela podia deixar aberta, apagou a luz que ficava acima do espelho, apanhou a bolsa e foi.

Escrito por Alberto Granato